quinta-feira, 16 de abril de 2020

ENTREVISTA: WARLLON DE SOUZA BARCELLOS - PROFESSOR



O blog hoje entrevista o professor WARLLON DE SOUZA BARCELLOS que é Assistente Social, Professor Universitário, Mestre em Políticas Sociais e Doutorando em Sociologia Política pela UENF, discutindo o problema do enfrentamento da questão econômica frente a uma grave pandemia de coronavírus, no Brasil e no mundo.



1)  O Brasil e o mundo passam por um momento de pandemia, o primeiro debate que se tem é a questão econômica. Essa análise tem que ser feita a curto prazo ou a médio prazo? 

Resposta: A questão econômica é muito importante e uma análise necessária, mas não pode se sobrepor à vida. Entendo a necessidade de venda e circulação de mercadorias, até mesmo para que isso possa gerar renda e empregos. Mas, em meio a uma pandemia, não tem como acreditarmos que isso fluirá naturalmente, precisa haver restrições inevitavelmente, isso é necessário para que se salvem vidas. Temos um sistema de saúde no Brasil muito frágil que não consegue atender a toda demanda causada pela COVID 19. Em consequência, existe uma tendência de morte dos mais pobres e mais vulneráveis, por não conseguir acessar aos serviços de saúde. Vale ressaltar que muito disso se dá em detrimento da Emenda Constitucional nº 95 no ano de 2016, onde se “congelou” os investimentos em Políticas Sociais por 20 anos e isso inclusive afeta diretamente a Saúde Pública brasileira. O Conselho Nacional de Saúde aponta que a necessidade de revogação da EC nº 95 se fortalece diante dos casos do Novo Coronavírus (COVID-19) no Brasil e que, até agora, de acordo com estudo da Comissão de Orçamento e Financiamento (Cofin) do CNS, o prejuízo ao SUS já chega a R$ 20 bilhões só em 2019. Ao longo de duas décadas, os danos são estimados em R$ 400 bilhões a menos para os cofres públicos. Para piorar a situação tem havido falas sistemáticas do presidente da república, Jair Bolsonaro, desqualificando o potencial do vírus, tratando este como uma “gripezinha”, bem como se posicionando contrário ao isolamento social. 


2) E as ações, devem ser tomadas pensando no hoje ou no hoje com preocupação com o amanhã? 

Resposta: Penso que não podemos deixar de pensar no amanhã, porque ele logo chegará. Defendo a importância do isolamento social, porém, reconheço que existem necessidades de manutenção da economia. Precisa haver um equilíbrio entre os dois. Sabendo que hoje é necessário o isolamento e que amanhã precisaremos de um país forte e saudável economicamente. Porém, que apresente características de valorização das políticas sociais, da ampliação do papel do Estado e principalmente a busca por condições mais justas e igualitárias. Importante destacar, que quanto mais rápido agirmos em combate ao COVID 19, mais rápido economicamente iremos nos estabelecer. Porém, a única orientação no mundo inteiro é o isolamente social. Portugal, por exemplo, agiu rapidamente, houve a restrição, o governo anunciou planos de apoio as empresas e de renda mínima aos trabalhadores. Com isso, não está com seus leitos lotados, poucos casos e provavelmente se recuperará muito mais rápido do que Espanha e Itália, que estão em situação muito complexa. 

3) O país já enfrentava um alto índice de desemprego, isso reflete agora, como isso influi na adoção de medidas de manutenção da renda mínima? 

Resposta: O Auxílio Emergencial é um instrumento utilizado pelo governo para atender principalmente os trabalhadores informais e desempregados. Vejo como uma política social de caráter compensatório. Ou seja, busca compensar as condições de superexploração do trabalho, o subemprego e as fortes consequências da aprovação da Reforma Trabalhista e da Previdência, onde foram retirados direitos sociais e trabalhista que só reforçam a informalidade e a precarização do trabalho. 

4) Que lições essa pandemia nos dá hoje e nos deixará como legado após o seu pico passar? 

Resposta: A Covid-19 tornou evidente que as sociedades não podem abrir mão de sistemas públicos de saúde e de seguridade social. Revelou que a legislação trabalhista é obviamente fundamental para a proteção do trabalhador. Na mesma linha, deixou claro que o mercado jamais substituirá o Estado no provimento do bem-estar social. Mostrou também a fragilidade de uma economia que não inclui. De modo contundente, nos alertou para o fato de que, apesar de nossas diferenças, precisamos nos unir na construção de alternativas solidárias à concentração de renda e a irresponsabilidade ambiental e social que marcam as destrutivas políticas neoliberais. Diante do desastre, nos demos conta de que é urgente costurar um novo pacto mundial. Um pacto multilateral, reciprocamente responsável, que reduza as assimetrias e estimule os países a adotar estratégias econômicas onde princípios como oportunidades iguais e dignidade para todos ganhem centralidade e participem ativamente dos projetos de desenvolvimento. No Brasil, assim como em outros países, o governo e a grande mídia vinham justificando a política de austeridade, afirmando que era preciso combater o déficit nas contas públicas e que não haveria recursos para financiar políticas de saúde, educação, assistência social e outras igualmente imprescindíveis como ciência e tecnologia. Sob tal argumento, a reforma trabalhista desamparou trabalhadores. Na mesma linha, a reforma da Previdência condenou a população a um futuro sombrio. E, até a pandemia aportar em nossas terras, estava em curso uma reforma administrativa que tinha por objetivo a construção de um Estado para poucos. 


5) Como o dualismo político influi na adoção de políticas de renda mínima? 

Resposta: Na Europa (alguns países) e nos EUA (de forma restrita) os governos correram para injetar os recursos necessários para combater a pandemia e os seus efeitos. Recorreu-se à reestatização, à redução drástica dos juros, a programas de renda mínima, à suspensão de pagamento de aluguéis, contas de luz e gás, taxas e impostos. No Brasil, apesar de acenar com a liberação emergencial de recursos, Guedes e Bolsonaro, defenderam, em meio à rápida evolução da pandemia, o aprofundamento das políticas de redução do Estado e cortes de direitos. Inclusive vale ressaltar, quem em meio a crise da COVID 19, o Plenário da Câmara dos Deputados aprovou, na madrugada desta quarta-feira (15 de abril), a Medida Provisória 905/19, que cria o contrato de trabalho Verde e Amarelo. Onde se retira ainda mais direitos da classe trabalhadora, aprofundando a mesma lógica de “fim da CLT” da Reforma Trabalhista de 2017. 

6) O mundo voltará ao “normal” pós pandemia? 

Resposta: Essa é uma pergunta que todos nós nos fazemos diariamente. Mas, tenho certeza que após tudo isso passar, nunca mais seremos os mesmos. Será um momento de reflexão para todos nós, em vários âmbitos de nossas vidas. 

7) O Noroeste Fluminense destoa nesse cenário ou o que se fala para o Brasil é aplicável à região?


Resposta: Com certeza se aplica, porém vale ressaltar que somos a região mais pobre do Estado do Rio de Janeiro (ERJ), com o menor IDHM (Índice de Desenvolvimento Humano Municipal), com altas taxas de desemprego, informalidade e subempregos. Penso ser importante, que o Governo do Estado tenha uma atenção especial ao Noroeste Fluminense que tem sido abandonado por décadas por várias gestões. O Noroeste é formado por 13 municípios que reúnem 2% da população do Estado do Rio de Janeiro. Para analisar e comparar os municípios brasileiros utiliza- -se o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal, o IDHM, que é resultado da média geométrica de três indicadores: longevidade, educação e renda. Tanto em 2000 quanto em 2010, os municípios do Noroeste apresentaram IDHM inferior ao do ERJ, embora esse índice tenha aumentado. Então, em tempo de pandemia, devemos seguir as orientações nacionais e mundiais, quanto aos cuidados preventivos a propagação da COVID 19. Entretanto, requer neste momento uma maior atenção a nossa região em detrimento dos seus índices significativos de pobreza.


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